quinta-feira, 2 de abril de 2009

O Camelo e o Leão


Transformar ou morrer dizia Baal Shem Tov, no século XVIII!

E com essa frase, inicio minha reflexão sobre este momento. Transformar ou morrer!

E por ser fiel a este princípio, enveredei pelo vale escuro da morte e por lá travei minhas lutas e minhas provas. Por amor e sobretudo por fidelidade a coragem que sempre foi virtude presente nos passos dos cabalistas.

Minha fidelidade tem sido há muitas vidas, libertar os laços que prendem a alma do homem e conduzi-lo ao melhor e mais livre de suas possibilidades. Eu sangraria por esse propósito, eu lutaria com o próprio anjo da morte por esse objetivo. Eu viajaria as dimensões mais inferiores para resgatar centelhas ancestrais e trazer de lá as experiências solitárias dos profetas.

Hoje, pois, meu objetivo é trazer a consciência do LEÃO em detrimento da sistematização do CAMELO.

Acredito que possa existir duas formas de ser dentro deste mundo. Ou os passos previsíveis e conduzidos sem vontade própria característico dos CAMELOS, ou sermos como LEÕES, que trazem em seu sangue o vigor da coragem e da força. E eu sou – digo “sou” pois nunca se deixa de ser – discípulo de BENARI, cujo significado é “filho do Leão”, e sou eu igualmente o filhote do LEÃO assim como todos aqueles que ousam enveredar pelas dimensões mais profundas do deserto da existência.

Há um traço de ira santa, que traz o sangue aos olhos do LEÃO e que o transforma em força de criar seu próprio destino.

E quem quiser ser o criador de seu próprio destino, tem de ser, antes de tudo, um destruidor e arrebentar valores.

Eu considero um cabalista de acordo com sua capacidade de dar exemplos. E de nada serviria a retórica dos livros, se a travessia do inferno não pudesse ser visto como real.

O “eu” verdadeiro é aquele que se inventa, que leva a uma atitude de transformar ou morrer. Nesse sentido, nós somos os poetas da nossa vida. Cada homem é um artista. Um artista que emprega a si próprio como matéria-prima.

A sua essência não está oculta no fundo do seu ser, mas na verdade está muito acima de você. Esse acima aponta para o cabalista, o domínio do dom profético. O dom profético consiste no potencial de superação que nós temos, uma capacidade dificilmente acessível, por estar coberta e limitada por uma gigantesca estrutura de pensamento robótico.

Conectamo-nos com essa potência, com essa força configuradora dentro de nós em algumas circunstâncias, como, por exemplo, quando as exigências do caminho lhe conduzem a enfrentar a morte e olhar em seus olhos de fogo.

E essa força interior questionadora e ardente é o profeta em nós.



Portanto meus queridos amigos do caminho, eu lhes trago como sempre, um presente das terras por onde andei. Eu lhes trago a controvérsia e a coragem de quem se faz LEÃO.

Mas as vozes interiores vinculadas ao lado negativo, são programadas para reduzir as coisas. Tudo tem que ser rapidamente compreendido pelo ego mesquinho. Qualquer coisa um pouco diferente causa irritação.

Mas como podemos nos modificar sem irritação!?



Este é o preço inevitável de se desejar livre. Quando se é livre, passa-se a ser visto com um misto de fascinação e negação.



Mas meu discurso é para os que trazem o espírito do LEÃO, os que se transformam. E é para vocês que trago essas palavras.



É necessário construirmos o novo homem – o profeta – como nos ensina Abuláfia. E por isso mesmo não podemos cair na armadilha da teorização.



Mas existe muito medo diante da possibilidade de se transformar. O familiar, mesmo quando nos faz sofrer, nos parece melhor que o estranho. O novo nos amedronta, e as feridas, que estamos sempre lambendo, até proporcionam prazer.



Transformar ou morrer nos ensinou Baal Shem Tov! Hoje eu ouso complementar que “transformar é morrer”! Morrer para renascer depois de olhar para a face de Deus e lutar com ele.

E não se pode sair desta luta sem morrer. Não se pode sair vitorioso sem perder. E esse é o objetivo essencial desta luta: PERDER para ganhar a si mesmo. E desta forma vamos do luto a alegria. E talvez não haja outro jeito de se chegar à alegria.



E travar esta luta na mente, no espírito e no corpo, evidencia mais uma vez a diferença entre TRANSPARECER e ATRAVESSAR, entre filosofia teórica e espiritualidade prática. Carrego com orgulho o fato de nunca ter oferecido aos meus amados discípulos um tipo de misticismo light. Seria a própria negação do LEÃO em mim.

O trabalho concreto do ser consiste então em indagar constantemente nossa própria condição. Mas que torpor é esse diante da transformação? Que paralisia é essa que consegue apagar o LEÃO em nós?

Em que contexto nossa vivacidade perdeu-se?

Como fazer para nos aproximarmos novamente da vitalidade?

Mas até o marasmo e o apagar da chama eterna se tornará matéria-prima nas mãos do cabalista. Uma vez que é do caos que nascem as estrelas.

Abuláfia era um músico e o ritmo, a arte era parte de sua estratégia de desenvolvimento espiritual. Por isso, não acredito em um profeta que não saiba dançar.

Um cabalista precisa de três coisas: perspicácia, profundidade e dança.

Metamorfoses do “eu” são fenômenos musicais. São ritmos. O homem é um inventor de ritmos. Só entendemos verdadeiramente as coisas quando a traduzimos em formas e ritmos.

O cabalista deve ser o maestro justamente por isso, porque ele conseguiu dançar com seu próprio caos interior. Ele precisa tornar-se um músico do espírito.

Trocar o CAMELO pelo LEÃO de modo musical – trocando o “você deve” pelo “eu quero”, mudando do “sim” do camelo para o “não” do leão – fugimos do perigo da arrogância e da mania de saber tudo.

Além da grande sensatez do corpo, o cabalista deve ressaltar a medicina do caráter e o valor da doença. A doença pode ser, na verdade, um impulso do corpo que sinaliza a necessidade de mudar de vida. A doença pode ser um primeiro passo em direção à suprema vida.

E então chegará o momento em que transformaremos o LEÃO no PROFETA de Abuláfia. Transformaremos o “eu quero” – do LEÃO, no “EU SOU” dos PROFETAS.

CORAGEM MEUS QUERIDOS DE ALMA!

A coragem não é a ausência do medo, é a capacidade de superá-lo, quando ele existe. É a força da alma diante do perigo.

A coragem não é um saber, mas uma decisão, não é uma opinião, mas um ato. É preciso coragem! Coragem para pensar, coragem até mesmo para sofrer ou lutar, porque ninguém pode pensar em nosso lugar – nem sofrer em nosso lugar, nem lutar em nosso lutar. E essa é mais elevada forma de coragem. A coragem da consciência. A coragem de não ceder ao medo, o impulso de se submeter à outra coisa que não a conformidade.

TRANSFORMAR É MORRER!

Mas para morrer é preciso ter coragem. E a coragem não se refere apenas ao futuro, ao medo, à ameaça; refere-se também ao presente, e essa coragem sempre está ligada à vontade, muito mais do que à esperança.

É por isso que a esperança só é uma virtude para os crentes, ao passo que a coragem o é para qualquer homem.

Mas, o que é necessário para ser corajoso?

Basta querê-lo, em outras palavras, sê-lo de fato. Não basta esperar a coragem por intermédio de “sinais” externos, apenas os covardes se contentam com isso.

CORAGEM E SIMPLICIDADE!

A simplicidade é esquecimento de si, de seu orgulho e de seu medo: é quietude contra inquietude, alegria contra preocupação, foco contra preguiça, espontaneidade contra conformidade, amor contra egoísmo, verdade contra pretensão.

E agora é o momento de encerrar com essa reflexão, pois o cabalista não se leva demasiadamente à sério nem ao trágico.

Ele deve seguir seu caminho, de coração leve, alma em paz, sem expectativas, sem nostalgia, sem impaciência.

O mundo é seu reino, e lhe basta.

O presente é a sua eternidade, e o satisfaz.

Nada tem a provar, pois não quer parecer nada.

Nada tem a buscar, pois tudo está aqui e agora.

E essa é a virtude dos sábios, e a sabedoria dos PROFETAS.

Vale a pena? Cabe a cada um decidir.

A vida real pulsa diante de nós.

Grandes turbulências geram grandes transformações.

Esse momento em que vivemos é para se PEGAR ou LARGAR.

PEGUE!

Escrito por Professor Mario Meir

Fonte > http://www.academiadecabala.com.br/index.php?option=com_content&view=article&catid=47%3Apanela-de-expressao&id=118%3Ao-camelo-e-o-leao&Itemid=33

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